sexta-feira, 10 de setembro de 2010

DEMÊNCIAS

[...] Com a luz os sonhos adormecem... o passado não é senão um sonho... de resto, nem sei o que não é sonho. Se olho para o presente com muita atenção, parece-me que ele já passou... o que é qualquer cousa? Como é que ela passa? Como é por dentro o modo como ela passa?... (Fernando Pessoa - O Marinheiro)


HISTÓRIA


• O nome Demência é derivado do latim de mentis (perder a mente).

• Na Mitologia Grega é visto o mito de Lethe, no qual existiriam duas fontes: Mnemosyne, da memória, e Lethe, do esquecimento, da qual beberiam os mortos para esquecer sua vida terrena e também as almas que voltariam à Terra para esquecer o mundo subterrâneo dos mortos.

• Datam de 1787 as primeiras descrições demenciais mais parecidas com conceitos utilizados na atualidade.

• Em 1816, a demência foi diferenciada da deficiência mental congênita.

• A partir de 1820, é visto uma maior produção científica a respeito de demência, com separação entre demências com lesões vasculares e puramente senis.

• Em 1907, Alois Alzheimer, psiquiatra e anatomopatólogo alemão, publica o caso de uma mulher de 51 anos, falecida após cinco anos de evolução de um quadro de demência com alucinação.

• Em 1910, Kraepelin inclui a demência pré-senil em seu Tratado de Psiquiatria e inclui as demências senis nos itens de Loucuras da Idade Involutiva.

• Em 1911, Emmanuel Régis, médico francês assíduo leitor de Freud, faz a diferença entre demência não inicial e essencial.

• Atualmente as demências estão incluídas na décima revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID – 10) nos itens de F00 a F09 de denominação Transtornos mentais orgânicos, inclusive os sintomáticos.



EPIDEMIOLOGIA

Doença de Alzheimer

• Prevalência de aproximadamente 1,5% em torno dos 65 anos até 30%, em média, ao redor dos 80 anos nos países desenvolvidos.

• Nos Estados Unidos, 3% a 11% das pessoas com 65 anos ou mais, e 25% a 47% daquelas com mais de 85 anos têm demência.

• A partir dos 65 anos, sua prevalência dobra a cada cinco anos.

• Entre 60 e 64 anos apresenta prevalência de 0,7%, passando por 5,6% entre 70 e 79 anos, e chegando a 38,6% nos nonagenários.



Demais demências

• A Demência Vascular é a segunda causa mais freqüente de demência em países ocidentais, correspondendo a cerca de 10% dos casos, com dados de prevalência encontrados entre 1,2% a 4,2% em indivíduos acima de 60 anos.

• A Demência na doença de Pick (Fronto-temporal) responde por 10% a 15% dos casos de demência degenerativa, ocorrendo principalmente após os 40 anos de idade, com igual incidência em homens e mulheres7.

• A Demência na doença de Creutzfeldt-Jakob possui incidência anual de 1:1 milhão de pacientes, evoluindo para óbito entre seis meses e um ano. Acomete pacientes nas diversas faixas etárias, entretanto com maior incidência entre a 5ª e 6ª décadas.

• Na Demência na doença de Huntington, a prevalência de indivíduos afetados com essa doença tem uma distribuição relativamente homogênea em todo mundo variando de 5 a 10 casos por 100.000 indivíduos.

• A Demência pelo vírus HIV tem incidência observada em 30% das pessoas que já haviam desenvolvido AIDS, unido a outras alterações do SNC.

• A Demência com corpos de Lewy corresponde à terceira causa mais freqüente de demência em estudos de autópsias realizados em vários centros de pesquisa e acomete cerca de 20% dos pacientes com demência.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA

Doença de Alzheimer (DA)

• O estabelecimento da DA deve-se à junção de eventos genéticos e ambientais.

• Verifica-se uma atrofia cortical, aumento dos sulcos cerebrais e do tamanho ventricular.

• O cérebro apresenta uma perda neuronal com acúmulo de placas neuríticas, degeneração granulovacuolar e angiopatia amiloidéia.

• As alterações patológicas mais severas são produzidas no lobo temporal medial.

• Na DA há hipoatividade de determinados neurotransmissores como a acetilcolina e a noradrenalina.

Demais demências

• Na Demência Vascular, os vasos afetados são comumente os de pequenos e médios calibres que ao infartarem produzem lesões múltiplas no parênquima cerebral. O termo se refere a qualquer demência causada por doença cerebrovascular.

• A Demência na doença de Pick (Fronto-temporal) é marcada por disfunção dos lobos frontais e temporais, geralmente associada à atrofia dessas estruturas, e relativa preservação das regiões cerebrais posteriores. As áreas afetadas caracterizam-se por perda de neurônios, gliose e massas de elementos citoesqueléticos (corpos de Pick).

• A Demência na doença de Creutzfeldt-Jakob trata-se de uma enfermidade infecciosa e invariavelmente fatal que atinge o sistema nervoso central e caracteriza-se por quadro demencial rapidamente progressivo e envolvimento focal variável do córtex cerebral, gânglios da base, cerebelo, tronco cerebral e medula espinhal.

• A Demência da doença de Huntington é transmitida hereditariamente como uma doença autossômica dominante de penetrância completa. A primeira alteração neuropatológica da DH é a perda de neurônios na parte paraventricular medial do núcleo caudado e no putâmen dorsal com progressão para alterações microscópicas referentes à depleção neuronal e a astrocitose fibrilar.

• O desenvolvimento de Demência pelo vírus HIV vem acompanhado de anormalidades parenquimais em Ressonâncias Magnéticas.

• Há uma forte influência genética na etiologia da Demência com Corpos de Lewy. A formação de corpos de Lewy está associada à perda neuronal nos sistemas dopaminérgico nigroestriatal e colinérgico basal frontal. Os CL são encontrados nos núcleos subcorticais e em regiões corticais cerebrais.



QUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICO

Doença de Alzheimer (DA)

• A DA é caracterizada por alterações cognitivas e comportamentais, com preservação do funcionamento motor e sensorial até as fases mais avançadas da doença.

• O primeiro sintoma da DA é usualmente o declínio da memória, sobretudo para fatos recentes (memória episódica) e desorientação espacial.

• A instalação dos sintomas ocorre de forma insidiosa, com piora lentamente progressiva.

• Alterações de linguagem (principalmente anomia), distúrbios de planejamento (funções executivas) e de habilidades visuais e espaciais surgem com a evolução do quadro.

• Sintomatologia psicótica (como idéias delirantes, sobretudo de caráter persecutório, e alucinações) é habitualmente mais comum nos pacientes mais idosos.

• O diagnóstico clínico da DA se baseia na observação de quadro clínico compatível e na exclusão de outras causas de demência por meio de exames laboratoriais e de neuroimagem estrutural.

• O diagnóstico definitivo de DA só pode ser feito mediante a análise histopatológica do tecido cerebral post-mortem.

Demais demências

• A apresentação clínica da Demência Vascular (DV) depende da causa e localização do infarto cerebral. O diagnóstico de DV é sugerido na presença de uma tríade: fatores clássicos de risco cerebrovascular, manifestações clínicas de episódios cerebrovasculares prévios e a existência do próprio quadro demencial.

• Na Demência na doença de Pick evidenciam-se, clinicamente, no estágio inicial, transtornos de personalidade, condutas anti-sociais e desinibição. Num momento posterior, aparecem transtornos da linguagem, com anomias, estereotipias e alterações na compreensão. Os critérios diagnósticos centrais são: começo insidioso e progressão gradual; deterioração precoce da conduta interpessoal e no manejo da conduta pessoal; embotamento emocional precoce e perda precoce do insight.

• Os aspectos clínicos da Demência na Doença de Creutzfeldt-Jakob compreendem um quadro de demência associada a manifestações comportamentais, extrapiramidais, cerebelares e mioclonia.

• Na doença de Huntington (DH) há alterações no controle motor e emocional, prejuízo da habilidade cognitiva e o aparecimento de movimentos involuntários, classicamente a coréia. O diagnóstico da DH pode ser realizado baseado na presença das manifestações clínicas de disfunção motora progressiva, envolvendo movimentos voluntários e involuntários, acompanhados de distúrbios mentais como déficit cognitivo, distúrbios afetivos e alterações de personalidade em pacientes que apresentam uma história familiar positiva de DH.

• A Demência pelo vírus HIV tem um início subagudo e caracteriza-se por apatia, dificuldade de concentração, prejuízo de memória verbal e funções executivas, disfunção motora e distúrbios de comportamento. Com a progressão pode haver ataxia, disartria, mutismo, delírios e alucinações visuais.

• As características clínicas da Demência com Corpos de Lewy (DCL) são: início gradual da demência com proeminente déficit de atenção ou estados confusionais agudos e presença de sintomas parkinsonianos. Como critério diagnóstico, ficou definido que, para diagnóstico provável de DCL, são essenciais a presença de duas das três características, enquanto, para diagnóstico possível, é necessária a presença de somente uma das características.



CURSO E PROGNÓSTICO

• As demências são patologias que podem ter início súbito ou insidioso, e na maioria das vezes cursam com deteriorização progressiva, esta segue por um período médio de 5 a 10 anos.

• O curso também pode ser variável sendo do tipo progressivo, o que ocorre na maior parte dos casos, estático ou regressivo.

• O prognóstico depende da etiologia da demência, de quão cedo é feito seu diagnóstico e do tipo e início do tratamento adotado.

• As demências podem ser classificadas como reversíveis, que possuem melhores prognósticos, e normalmente possuem causa sistêmica como a demência medicamentosa, vascular e traumática; e demências irreversíveis, possuem prognóstico mais sombrio e tem como causas primárias processos degenerativos e/ou atrofiantes cerebrais, entre elas estão as demências de Pick, Alzheimer, Huntington.

• No caso da Doença de Alzheimer, tem-se uma evolução relativamente lenta, porém com prognóstico ruim, e o óbito ocorre cerca de 15 anos após o início. A ocorrência de manifestações psicóticas se correlaciona com curso clinico mais desfavorável.

TRATAMENTO

• O tratamento dos sintomas das demências requer cuidados específicos a fim de melhorar a qualidade de vida tanto do doente quanto do seu cuidador.

• As classes de fármacos mais utilizadas são os antipsicóticos, os benzodiazepínicos, os antidepressivos e os anticonvulsivantes.

• É importante ter em mente que nas demências vários sintomas podem coexistir, e dessa forma deve-se optar pela medicação que o controle da forma mais abrangente, evitando a polifarmácia.











REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS



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Por: Ana Carolina Santos, Edla Cavalcanti, Gabriela Gama, Jaqueline Silva.

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